quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Coisas que acontecem na Diabetes e Exames que levam ao seu Diagnóstico


Ontem, ao conversar com uma paciente (não minha, pois sou apenas estudante), me deparei com a seguinte questão: ela sabia exatamente o básico que todos sabem. Ela mesmo me disse que o diabético não pode comer doce para não aumentar o nível de glicose no sangue, mas se esse nível baixar muito deve-se ingerir um doce para aumentar a quantidade de volta para o normal. Ai ela me concluiu que o nível de glicose no sangue é como uma balança, que deve ser mantida constante. Ai ela disse que a hiperglicemia era prejudicial ao corpo. Eu concordei com ela. Foi então que veio a grande pergunta: porquê? O que me deixou surpreso é que depois de vários anos, indo em vários médicos, nenhum a explicou como a hiperglicemia afeta a pessoa. Por isso, esse post tem o objetivo de clarear algumas coisas que acontecem na diabetes.

No mundo químico tudo busca o equilíbrio. Um exemplo disso é a osmose: quando existem dois sistemas em contato porem com concentrações de sais, eletrólitos diferentes, a água tende a ir do meio menos concentrado para o mais concentrado de modo a tentar diluir o mais concentrado e igualar as concentrações.

No nosso corpo, em situação normal, as células possuem bastante glicose, que será usada por elas para obter ATP. Nessas condições normais a concentração de glicose no sangue é menor do que nas células e por isso a água irá sair do sangue e entrar na célula.

Já no caso da hiperglicemia, a concentração de glicose no plasma sanguíneo vai estar muito aumentada de modo que chega a ser maior que da célula. Por isso, a água vai fazer o caminho inverso: vai sair da célula. E isso danifica muito a célula podendo levar a sua morte por desidratação.

Como as células vão estar perdendo água o sistema nervoso irá interpretar que o indivíduo está se desidratando e estimular a sede, para repor a água perdida. Por isso um dos sintomas da diabetes é a sede excessiva. Com o maior consumo de água, obviamente, o volume de urina ira acompanhar esse aumento (outro sintoma observável na diabetes). Além disso, a grande quantidade de glicose no sangue vai estimular a dilatação da arteríola aferente e a contração da contração da arteríola eferente no glomérulo, de modo que a filtração do sangue no rim irá aumentar. Na normalidade, toda a glicose que fosse filtrada para o rim seria reabsorvida para a corrente sanguínea. A urina normal não possui açúcares. Porém, na diabetes a concentração de glicose é tão grande que o rim não consegue reabsorver tudo para a corrente sanguínea, de modo que glicose será expelida na urina, o que será um indicativo de falência renal (conseqüência avançada da diabetes).

Com todo esse volume de água aumentado no sangue, sua pressão nos vasos sanguíneos ira aumentar também, causando hipertensão. Se essa hipertensão for muito forte, pode ocasionar acidentes vasculares como um AVC.

O fato relevante que acontece é que junto com a saída de água da célula ocasionada pela hiperglicemia acaba saindo, também, potássio de dentro da célula. E a entrada de potássio para a célula é estimulada pela insulina. Entretanto, se o indivíduo está com hiperglicemia é porque a insulina esta baixa o suficiente para não conseguir colocar a glicose para dentro das células e não vai conseguir estimular a volta do potássio para a célula. E sem esse potássio as funções eletrolíticas das células ficam desreguladas; principalmente a condução de impulsos nervosos fica desregulada. E o aumento da concentração plasmática de potássio causa arritmia cardíaca (concentrações muito elevadas podem causar parada ou fibrilação cardíaca).

Para tentar reparar isso o rim irá aumentar a excreção do potássio. Por isso, após algum tempo o potássio disponível no corpo será diminuído. Se um paciente estiver internado em um hospital por uma crise diabética ele deverá receber 3 medicamentos:

- Insulina: para regularizar a glicose no sangue.

- Algum medicamento para abaixar a pressão, para evi

tar acidentes vasculares.

- Suplementação de potássio: para repor o potássio perdido e garantir que tenha potássio para entrar na célula.

Irei comentar, agora, os métodos usados pelos médicos para diagnosticar a diabetes. Geralmente são usados 3 testes principais para confirmar o diagnostico. São eles: a glicemia em jejum, a hemoglobina glicada e a curva glicêmica.

Glicemia. É uma dos exames mais usados tanto para diagnosticar a diabetes quanto para o controle diário do diabético. Esse exame é feito medindo-se a quantidade basal de glicose no sangue, isto é, a quantidade de glicose no sangue do indivíduo ao acordar, com pelo menos 8 horas de jejum. É importante que esse valor esteja na média normal para garantir que o corpo está tendo sucesso em regular a glicose sanguínea, deixando-a o mais constante possível.


A figura acima mostra um exemplo de exame da glicemia de um diabético e os valores de referência adotados pela associação americana de diabetes.

Nesse exame, valores abaixo de 70 mg/dL indicam a hipoglicemia, que também é importantemente perigosa por não possuir glicose no sangue suficiente para alimentar as células, principalmente do tecido nervoso, que só produzem energia a partir de glicose.

Valores até 99 mg/dl são os considerados normais.

De 100 a 125 mg/dl o paciente é considerado como intolerante à glicose. Esse é um intervalo essencialmente importante pois ele indica que se os habitos de via atuais forem mantidos o indivíduo irá virar diabetico. Porém, nesse intervalo, em grande parte das vezes, é possivel evitar ou adiar o desenvolvimento da doença, por meio de mudança na alimentação e pratica de exercícios. É nesse momento em especial que dever ser maçivamente empregadas medidas preventivas.

Valores acima de 126 mg/dl indicam ao diagnostico da diabetes mellitus. O paciente deve fazer o uso da insulina e controlar a alimentação de modo a controlar esses valores e prevenir os males trazidos pela doença.

Curva glicêmica. Geralmente, após o exame da glicemia o médico pede a curva glicemica para confirmar o diagnóstico. O exame tem a finalidade de medir a eficiencia da captura de glicose pelo individuo. O paciente coletará a glicemia basal, feito isso, ele irá ingerir 75g de glicose e 2 horas após, ele medirá novamente a quantidade de glicose no sangue. A curva glicemica clássica faz o acompanhamento de 30 em 30 minutos. Geralmente também são medidos os níveis de insulina no sangue. O gráfico abaixo mostra a curva esperada em uma pessoa normal e em uma diabética.

Numa pessoa normal, quando a glicose entra na corrente sanguínea a insulina vai ser rapidamente estimulada e liberada pelo pâncreas de modo a colocar a glicose para dentro das células. Em 2 horas a taxa de glicose sanguínea já deve estar em seu valor normal. No caso do diabético isso não acontece, a insulina é insuficiente por isso a concentração da glicose no sangue irá subir muito mais e demorar muito mais a voltar ao normal.

Nesse exame, o valor normal é ate 140 mg/dl após duas horas da ingestão da glicose. Qualquer valor da curva acima de 200 mg/dl levam ao diagnóstico de diabetes mellitus. Vale ressaltar que esse exame não deve ser feito por pessoas que já são diagnosticadas como diabéticos pois a alta quantidade de glicose ingerida pode ser altamente perigosa e danosa. A tabela abaixo mostra os valores de referência para esse exame de acordo com o Consenso Brasileiro de Diabetes de 2002.

Hemoglobina Glicada. Esse é um termo genérico que se refere ao conjunto de substâncias formadas com base na relação entre hemoglobina e alguns açúcares. A utilizada no teste de diagnóstico de diabetes é a hemoglobina glicada propriamente dita, que possui uma hemoglobina ligada a uma glicose por uma ligação estável e irreversível, a HbA1c ou A1C.

Com o passar do tempo, a glicose vai ser ligando com a hemoglobina. Se nesse tempo a concentração de glicose plasmática se manteve constantemente alta terá grande porcentagem de hemoglobina glicada. Já se essa concentração foi constantemente baixa por muito tempo, a porcentagem de hemoglobina glicada também será pequena. Dessa maneira é possível saber se nos últimos 2 a 4 meses a concentração de glicose no sangue foi baixa ou alta.

A hiperglicemia prolongada provoca o desenvolvimento de lesões irreversíveis que afeta os olhos, rins, nervos e os vasos sanguíneos, como discutido anteriormente. O gráfico abaixo mostra a relação entre a porcentagem de hemoglobina glicada e o risco dessas complicações.

Em pessoas normais, a porcentagem da hemoglobina glicada esta entre 1 e 4%. Porém, valores até 6,5% ( ou 7% de acordo com algumas associações) são considerados normais. Acima disso, o diagnóstico é de diabetes.

Com base em dois estudos, foi feita um tabela que relaciona a porcentagem de hemoglobina glicada com a média da concentração da glicose no sangue mantida nos últimos 2 a 4 meses. A tabela está mostrada abaixo:

Essa tabela é importante para que o médico e o paciente acompanhem como está sendo o controle da glicose realizado pelo paciente e ver se foi eficiente e continuar ou mudar o tratamento. E diagnosticar diabetes de acordo com a concentração de glicose plasmática dos últimos tempos. Um exemplo de exame de um diabético esta mostrado abaixo.

3 comentários:

  1. Fontes:
    - Tratado de Fisiologia Médica de Guyton & Hall 11ª Edição (parte sobre diabetes)
    - Atualização Sobre Hemoglobina Glicada (A1C) Para Avaliação Do Controle Glicêmico E Para O Diagnóstico Do Diabetes: Aspectos Clínicos E Laboratoriais; Posicionamento Oficial 3a Edição 2009
    - Exames do Laboratório Exame
    - Consenso brasileiro sobre diabetes 2002: diagnóstico e classificação do diabetes melito e tratamento do diabetes melito do tipo 2. – Rio de Janeiro: Diagraphic, 2003.

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  2. Kouzak,
    Parabens pelo Post !!

    Marcelo Hermes

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  3. Parabéns!
    Realmente foi muitíssimo importante você postar todo seu conhecimento para nós. Valeu!

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